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Breve explanação sobre a suspensão de novos loteamentos em Salto

A falta de água foi um dos argumentos usados para a adoção desse decreto. Isso, na verdade é fakenews.

Por Wellington Caposi em 16/04/2021 às 09:09:51

Um sistema de abastecimento de água consiste no conjunto de obras, equipamentos e serviços com o objetivo de levar água potável para uso no consumo doméstico, indústria, serviço público, entre outros. Um sistema de abastecimento de água é formado por diversos setores, sendo eles: Manancial; Captação; Adução; Tratamento; Reservatório e Rede de distribuição.

Vamos entender o que é cada uma delas?

Um MANANCIAL nada mais é do que a fonte onde se retira a água bruta para abastecimento da cidade. Aqui em Salto temos três manaciais em uso: o principal, Ribeirão Piray (cuja outorga permite um máximo de bombeamento de 300 litros/seg. segundo ilustração abaixo do AresPCJ ou 400 litros/seg. segundo o DAEE - mas isso não faz diferença nessa análise) é responsável por 80% do abastecimento da cidade; o manacial da Fazenda Conceição (que fornece, por gravidade, 50 litros por segundo; completa o sistema Piray/Conceição) e por último o ribeirão Buru (cuja outorga é de 120 litros por segundo, mas o bombeamento chega a um máximo de 80 litros/seg.). Uma ressalva aqui: se não houver procura de novos mananciais, no futuro, certamente faltará água na cidade. Mas por hora não.


A CAPTAÇÃO consiste nos equipamentos e instalações que retiram a água do manancial e a joga na ADUÇÃO, que é a tubulação, normalmente sem variações de diâmetro, que liga a captação à estação de tratamento de água. Outra ressalva aqui: as linhas de adução são antigas e obsoletas. Essa etapa pode funcionar de duas formas: por gravidade ou por bombeamento até o TRATAMENTO da água (em Salto, as ETA"s Bela Vista e João Jabour). As estações de tratamentos existentes precisam de recuperação e modernização. Os RESERVATÓRIOS, tem como finalidade o armazenamento da água tratada e seu objetivo é atender as demandas de emergência, manter uma pressão constante na rede e suportar a variação de consumo. Essa variação acontece de acordo com os hábitos da comunidade, do clima e até mesmo da qualidade da água. Falta muita reservação de água em Salto, hoje operamos no limite.

Por fim, chegamos à REDE DE DISTRIBUIÇÃO, último setor do sistema que leva a água dos reservatórios para as residências dos consumidores.


Somando-se então o volume de água tratada das duas estações de tratamento de água aqui em Salto (ETA"s Bela Vista e João Jabour) teremos o volume aproximado 1 bilhão de litros, que é jogado na rede de distribuição mensalmente. Em paralelo, temos o volume de água tratada que é faturado mensalmente pelo SAAE Salto. Esse volume gira em torno de 700 milhões de litros de água consumida. Aqui já mensuramos uma perda de 300 milhões de litros de água tratada por mês somente na rede de distribuição. Isso está dentro da normalidade? Acho que poderia e deveria ser minimizada.

Isso tudo para explicar que é necessário um estudo bem amplo e técnico para determinar que a culpa da FALTA DE ÁGUA recaia apenas sobre o setor imobiliário da cidade. Se levarmos em conta a incompetência da falta de investimentos no setor nos últimos 25 anos, já teremos parte dessa resposta. O decreto nº 111, de 13 de abril de 2021, suspendeu pelo período de 180 (cento e oitenta) dias, os atos administrativos relativos ao processamento e aprovação de projetos de empreendimentos imobiliários, que impliquem na construção de prédios ou implantação de loteamentos em Salto. Devido a falta de planejamento, o setor imobiliário pode ter contribuído para tanto, mas a culpa pela falta de água nas torneiras dos consumidores merece um análise mais abrangente. Mas certamente isso deverá ser analisado com mais profundidade.

Uma comissão foi criada para avaliar, criteriosamente, sob ASPECTOS TÉCNICOS e JURÍDICOS, sempre com respaldo no interesse público, e verificar a legalidade de processos e projetos já aprovados e implementados. Nessa comissão nomeada, vários juristas e nenhum especialista em hidráulica. O decreto fala em consultas técnicas se necessário for. Certamente será.

Voltando à questão da água tratada, para ter uma visualização mais focada e direta, gasta-se hoje em média no Brasil, 153 litros de água tratada por habitante, por dia. Isso significa então que, uma cidade como Salto, com 120 mil habitantes, gastaria perto 550 milhões de litros de água tratada no mês. Se o SAAE Salto está faturando 700 milhões de litros de água por mês, significa que estamos gastando 150 milhões de litros a mais e isso mostra desperdício. Se considerarmos então os 900 milhões de litros despejados na rede de distribuição esse desperdício aumentará ainda mais. No Rio de Janeiro, que é a cidade que mais gasta no Brasil, esse valor chega a 200 litros por dia. Chegamos então à outra conclusão: gasta-se água tratada à toa em Salto. Se invertermos essa conta, chegaremos a 195 litros de água tratada gastos por dia para cada um dos saltenses. O que beira o absurdo.


Dessa forma, temos água nas ETA"s Bela vista e João Jabour, mas falta nos bairros. A bem da verdade, se o setor de distribuição de água tivesse sido projetado adequadamente de forma eficiente nesses anos anteriores, esse volume de água desperdiçada - 150 mlhões de litros no mês, no mínimo - daria para outros 30 mil habitantes. Ou seja, com um volume de 700 milhões de litros de água tratada por mês, distribuídas de forma adequada e correta, abasteceria uma cidade de até 150 mil habitantes. Aqui, chegamos então à conclusão que hoje não falta água em Salto. O que faltou, na verdade, foram investimentos necessários na distribuição e na reservação nos últimos 25 anos. Para tanto, há hoje a necessidade de investimentos pesados no setor.

Qual foi a última grande obra com recursos próprios em Salto?

Não houve e certamente não haverá. Todas as novas avenidas, novas escolas, novas creches, o parque linear, reformas de museus e praças, e até clínicas de Saúde; todas foram feitas através de contrapartidas de empreendimentos ou recursos de emendas parlamentares. A prefeitura de Salto não tem poder de investimento com um orçamento altamente comprometido com a folha de pagamento de seus servidores mais a aplicação obrigatória de verbas na Saúde e Educação. E, o que faz um governo sem esse poder de investimento? Nada...

Como nem a prefeitura e nem o SAAE Salto possuem caixa para investimento, um diálogo franco e transparente com empreendedores imobiliários poderia ser bastante interessante no sentido de vislumbrar recursos para esse financiamento. A substituição de redes antigas e deterioradas de distribuição de água tratada é urgente. Poderia até ser feito como contrapartidas de novos empreendimentos, mas com direitos e deveres claros e transparentes. Tudo aberto para a fiscalização da Câmara de Vereadores.

Uma solução que está bem diante de nossos olhos, com uma gestão focada na solução do problema e de forma transparente. Tudo se resume ao diálogo aberto e público que poderia ser benéfico para todos. Sem isso, certamente não chegaremos a nenhum denominador comum, principalmente com atitudes unilaterais e sem a participação de setores importantes que possam contribuir de forma efetiva e participativa nessa resolução.

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