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O governo do Estado de São Paulo tem intenção de privatizar a SABESP. E o SAAE Salto, deveria ser privatizado? por Enivan Balieiro

Por Ernivan Balieiro em 13/01/2023 às 10:05:36

A SABESP foi criada em 1973, através de um programa do Governo Federal para incentivar a companhias estaduais de água e esgotos. Desde então, a companhia tem apresentado números que brilham aos olhos de qualquer investidor, já que a empresa possui ações na Bolsa de Valores de São Paulo e também na Bolsa de Valores de Nova Iorque (NYSE) desde 2002. Abastece 28,4 milhões de pessoas com água e coleta esgoto de 25,2 milhões de pessoas em 363 municípios.

Em 2021, seu lucro líquido foi de R$ 2.3 bilhões de reais. Todas essas informações estão disponíveis a qualquer pessoa em seu sitio, no relatório de informações financeiras e resultados. Eu tive a oportunidade de conhecer o trabalho dessa gigante do saneamento, em Cabreúva, cidade atendida pela SABESP, onde fui visitar a reversão do ribeirão Jundiuvira e também conhecer as instalações da principal Estação de Tratamento de Esgoto que está ao lado do ribeirão Pirai.

Também estive na E.T.A. Maracanã, em Jarinu, para conhecer o tratamento de lodo nas pesquisas para o projeto de tratamento de lodo da E.T.A. João Jabour, aqui em Salto. Tive a oportunidade de conversar com pessoas apaixonadas pela SABESP, uma empresa com vigor financeiro invejável tocando obras que impressionam pela importância, urgência e necessidade. Os motivos que o atual governador alegou para privatizar são de que o custo operacional da SABESP é 20% maior do que o custo executado pela iniciativa privada, o que poderia tornar a empresa inviável no futuro. Não vou entrar no mérito dessa questão, pois não adentrei na administração da SABESP, e sim de uma autarquia infinitamente menor e com números opostos.

Durante meu período a frente ao SAAE Salto, o administrei como uma empresa, assim como a SABESP também assim o é, e todos os processos conduzidos por mim e pelos diretores, foram de tornar a autarquia mais eficiente e melhor atender a população. O SAAE Salto abastece cerca de 53 mil endereços - indústria, comércio ou residências -, sendo que desses três mil não tem coleta de esgoto. A situação do saneamento em nossa cidade é uma "jabuticaba", como ouvi várias vezes em reuniões de Associação de Saneamento ou de agências ligadas ao tratamento de água e esgoto. Temos uma autarquia que capta, trata e distribui água, e ainda cuida de toda manutenção da rede de água e também a de ESGOTO. O SAAE Salto somente recebe a tarifa pela água tratada e da coletar de esgoto (taxa de afastamento) através da rede e entregar na rede coletora da concessionária responsável pelo tratamento do esgoto. Esse é coletado e conduzido para a Estação de Tratamento de Esgoto em conformidade com uma concessão do município (contrato de 1996).

A autarquia não é rentável, nunca foi, haja vista que no ano de 2021 precisou de aporte de R$ 2,5 milhões de reais para complementar o pagamento de funcionários no final do ano, já que não tinha caixa para tanto. Em 2022, só não precisou pedir novo aporte porque houve o reajuste da tarifa, que foi muito criticada. No entanto, o bolso de quem paga é o mesmo, ou se paga a água - por sinal uma das mais baratas da região -, ou a paga através do IPTU, uma das formas de arrecadação da Prefeitura para cobrir os prováveis "rombos" no caixa da autarquia.

Em 2022, o SAAE Salto fez vários investimentos estruturais, e isso só foi possível, porque a Prefeitura repassou a quantia de R$ 2,84 milhões de reais e outros R$ 1.8 milhões para implementar um reservatório necessário na região do Jardim Donalisio. Mas isso não é nem a ponta do iceberg, apenas ínfimos exemplos de como Salto carece de investimentos em Saneamento Básico, que deveria ser feito pelo próprio SAAE, já que em sua constituição, a proposta é de um Serviço Autônomo.

E por que isso não acontece?

Onde está a autonomia do SAAE Salto que não tem recursos para investir?

Seu custo é alto para tornar inviável a operação?

Eu lhes afirmo, não é. Perdemos vários servidores em 2022 para as cidades vizinhas que pagam um salário melhor ou um conjunto de benefícios maior e não tive como argumentar para reter esses bons profissionais. Os quadros de operadores das E.T.A.´s e do Operacional da autarquia são tão enxutos que se torna perceptível em momentos de grande demanda, mas na maioria das vezes dão conta do serviço.

Assim, se a autarquia está com quadro ajustado, custos adequados, onde está o problema para que não consiga investir e melhorar o sistema de abastecimento?

A resposta é bem simples: o sistema de remuneração é injusto com a autarquia. O "bolso" que paga é o mesmo, mas o bolso de quem recebe não. Muitos criticam a concessionária que cuida do tratamento do esgoto, pois alegam que fica com a maior parte do recurso da tarifa. Toda empresa que visa lucro, trabalha pelo dinheiro e otimiza seus recursos para isso. Cabe ao poder público, trabalhar para que os contratos sejam mais justos, prevendo inclusive que atitudes políticas não interfiram na relação contratual entre as concessões publicas puras ou hibridas como a existente.

O contrato com a concessionária que trata o esgoto prevê reajuste anual (com indexador definido) e no caso da autarquia, depende de algo mais. Em 2020 e 2021 tivemos uma pandemia que assolou o mundo, e a maioria dos governantes seguraram reajustes e inclusive cortes de fornecimento de água, como politicas públicas para ajudar os mais necessitados. Entretanto, na concessão privada isso não se aplica, pois no caso do contrato feito, a inadimplência depois de 90 dias fica com o município, ou seja, o ônus do negócio é do SAAE Salto e não das duas partes. Se não houver reajuste na tarifa, isso passa a ser um problema exclusivo da autarquia, pois o contrato de concessão não prevê a falta de reajuste. Se não for aplicado, vira infração contratual, e será cobrado posteriormente com juros e multa.

E a resposta da pergunta: O SAAE deveria ser privatizado?

Não deveria, pois tem uma operação extremamente enxuta, com custo baixo. Ele necessita urgentemente de investimentos em equipamentos de manutenção, de uma frota renovada e melhor equipada, de uma nova Estação de Tratamento de Agua e também de adequar o local da Estação de Tratamento do João Jabour para evitar paradas devido a enchentes. Deveria ainda investir em grandes reservatórios em pontos estratégicos para poder armazenar agua tratada; investir em represas para agua bruta e fazer um trabalho intenso de recuperação das nascentes que afetam diretamente o abastecimento, principalmente da bacia do ribeirão Buru.

Tudo isso não será possível somente com investimento da prefeitura, o SAAE Salto tem de ser autônomo e para isso ele deve ser responsável pelo tratamento de agua e também de esgoto, administrando 100% desse processo, como deveria ser - de fato - uma autarquia de saneamento.

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ERNIVAN FERNANDES BALIEIRO, formado em Administração de Empresas com Especialização em Finanças Empresariais, Contabilista e Advogado com Especialização em Direito Tributário. Atuou como Administrador de Empresas com foco em Gestão Administrativa e Financeira em empresa de pequeno, médio e grande porte, passando por empresas nacionais e multinacionais. Atualmente advogando em Salto. Lecionou por duas oportunidades da Escola Humanidade (Guardinha) entre 2003 e 2008 e mais recentemente, entre 2015 e 2019. Foi professor universitário da UniSantana, Faculdade Cesar Lattes e nos últimos 10 anos no CEUNSP. Esteve a frente da autarquia SAAE de Salto por dois como Superintendente.

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